Aurê Aguiar

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Quando foi a última vez que você fez algo pela primeira vez?

Aurê Aguiar • 08/09/2023

“Hoje é a minha primeiríssima sessão de autógrafos, na Bienal do Livro. Também coube a mim ser a primeira capixaba – por certificação – a lançar uma obra em uma bienal nacional.”

A primeira menstruação, a primeira transa, o primeiro dia na escola, o primeiro beijo, o primeiro término, o primeiro botão da blusa.

A primeira carteira de motorista, o primeiro visto internacional, a primeira viagem, o primeiro amor, a primeira dor, a primeira festa, o primeiro dilema.

A primeira transgressão, o primeiro porre, a notícia em primeira mão.

O primeiro orgasmo, a primeira paixão, sair de si pela primeira vez para aterrissar no coração do outro. Desconhecer-se. Falar, entre risos, muito prazer para si.

Hoje, é a minha primeiríssima sessão de autógrafos. De cara, assim, sem ensaio, vou autografar meu livro de estreia “Cuide dos seus Achados. Esqueça os seus perdidos”, na Bienal do Livro, o maior evento literário do país. E, mais ainda, no aniversário de 40 anos da Bienal. Pensei que lançar um livro seria um sonho simples, o universo mandou realizar com emoção.

Não fosse isso o bastante para tirar o meu fôlego, também coube a mim ser a primeira capixaba – por certificação – a lançar uma obra em uma bienal nacional. A primeira autora da terra de Rubem Braga, que um dia, também viu suas palavras impressas pela primeira vez, com o mesmo assombro de estrear seu olhar sobre o mar. É grande o que se dá dentro da gente quando um sonho se realiza.

Ainda ontem, minhas palavras engatinhavam, escoravam-se em outras de grandes autores, grandes alturas, muros inalcançáveis, e desabavam desajeitadamente em frases retiradas do meu coração.

Hoje, na minha estreia oficial no mundo da escrita, irei vestida de forma casual, para estar confortável em mim, mas a verdade é que minha alma está nua e meu corpo tenso não sabe onde colocar as mãos.

Não dá para esconder a excitação de entrar pela mesma porta que Conceição Evaristo, Valter Hugo Mãe, Carla Madeira e Itamar Vieira Júnior, para citar alguns.

Não me acorde desse sonho, por favor, mas também não me lembre do pesadelo da primeira fila de leitores. Haverá fila?

O sangue gela só de pensar, mas logo me acalmo ao lembrar que meus três filhos e seus respectivos pares estarão lá e pelo menos mais uma dúzia de amigos muito fiéis. Pronto, já tem fila.

Queria que minha mãe fosse a primeira, mas ela não suportaria uma viagem de Minas ao Rio. Não faz mal. Ela está nesse lugar no meu coração. “Cuide dos seus achados. Esqueça os seus perdidos” é dedicado a ela, que nunca pode apegar-se às suas dores. Era sempre, por bravura, vida que segue.

Minha estreia hoje na bienal é a de uma filha da mãe, que recusou-se a sucumbir às perdas dos últimos anos, que recolheu cacos do coração partido e enfeitou a vida com mosaicos. Minha vida é minha obra de arte, cabe a mim decidir quais intervenções manterei nela, eu pratico o que escrevo.

Toda estreia é um salto no escuro. Dá vontade de voltar atrás. O inédito assusta. Mas o que tem depois dele é o que eu desejo. São as páginas em branco que pautam a minha vida. “O que ela (a vida) quer da gente é coragem. O que Deus quer é ver a gente aprendendo a ser capaz de ficar alegre a mais, no meio da alegria, e inda mais alegre ainda no meio da tristeza.” João Guimarães Rosa, guarde a minha mão na sua e me guie por esse caminho.

PS. A frase do título foi criada pela agência belga Satisfaction para a marca de bolsas Eastpak, mas eu a ouvi pela primeira vez através do Daniel Castanho, da Ânima Educação, que assina um depoimento sobre a minha escrita neste primeiro livro.

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